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Diversidade na publicidade: por que precisamos combater estereótipos e como criar um marketing inclusivo

Assistir a um homem com os pés para cima enquanto uma mulher limpa a casa em uma propaganda de televisão parece algo bem provável de acontecer, não é mesmo? E ver pessoas negras protagonizando anúncios ao folhear uma revista ou, ainda, um casal homoafetivo de idosos no outdoor de uma campanha? As respostas para essas perguntas podem nos trazer um bom panorama sobre a diversidade na publicidade.

Não é por acaso que mais de 60% das pessoas se sentem discriminadas pelos comerciais, como mostra a última atualização da pesquisa Visual GPS. Realizada pela Getty Images em parceria com a empresa YouGov, ela entrevistou mais de 5 mil participantes de 26 países.

Apesar de ser um tema muito mais em voga hoje do que no passado, certamente, ainda há muito para evoluir a fim de que a comunicação seja de fato representativa e inclusiva e pare de reproduzir estereótipos e reforçar preconceitos em relação a grupos minorizados. 

Como é a diversidade na publicidade no Brasil?

O Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA) da UERJ analisou anúncios publicitários produzidos entre 1987 e 2017 e publicou um estudo muito importante no âmbito da diversidade na publicidade brasileira.  

Durante a pesquisa, foram analisadas 13 mil figuras humanas no semanário de maior circulação do país, considerando gênero, raça, idade, ocupação e outros fatores. As conclusões mostram que nesses 30 anos de análise, 46% das figuras humanas das campanhas eram homens brancos, 37% mulheres brancas, 8% homens pretos ou pardos,  4% mulheres pretas ou pardas e 6% foram classificados como “outros”. 

Embora a representatividade entre homens e mulheres não seja tão desproporcional — a população brasileira tem 48,2% homens e 51,8% mulheres —, os pesquisadores constataram uma forte estereotipização de gênero em relação às mulheres. Na maior parte das propagandas, elas aparecem associadas a roupas e jóias, ou seja, produtos considerados essencialmente femininos.

Representatividade das pessoas negras está longe do ideal

No entanto, ainda mais marcante na pesquisa do GEMMA do que a questão de gênero foi a constatação das desigualdades de raça, como podemos perceber nos números. E mais: além de significativas, essa diferença abissal não se reduziu de forma significativa e constante com o passar do tempo.

Um cenário preocupante nesse sentido também foi apresentado pela pesquisa Todxs, feita pela ONU Mulheres com a Heads Propaganda em 2020. Ao analisar mais de 20 mil inserções publicitárias na TV e 6 mil posts no Facebook, o levantamento mostrou que o índice de mulheres negras como protagonistas de comerciais brasileiros nesses canais é de 22%. 

Esse estudo vem sendo realizado desde 2015, quando o percentual era de 4%. Portanto, ao longo dos anos, constatou-se uma forte evolução desse número. Porém, o último índice está abaixo dos 25% registrados em 2018. Já em relação aos homens negros, em 2019 a sua presença como protagonistas em anúncios era de 22% e caiu para 7% no último ano. 

Se pensarmos que a população brasileira é formada, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua 2016 do IBGE, por cerca de 8,2% de pessoas pretas e 46,7% de pessoas pardas, fica muito evidente que a representatividade das mulheres e dos homens negros está muito aquém do ideal e tem muito a melhorar.

Maior representatividade e menos estereótipos

As pessoas com mais de 60 anos também são sub-representadas na comunicação publicitária. O estudo Todxs mostrou que esse grupo aparece em apenas 12% das narrativas veiculadas com esse fim. Já a comunidade LGBTQI+ foi representada em pouco mais de 1% do material analisado.

Veja mais: Ações para Orgulho LGBTQI+: como promover a inclusão e criar um ambiente de trabalho seguro

Isso significa, sem dúvida, que a propaganda precisa ser muito mais representativa para de fato incluir todos os diversos grupos que compõem a nossa sociedade.

Contudo, outro ponto importante em relação à diversidade na publicidade é que trazer apenas a representatividade, embora seja fundamental, não é suficiente. É preciso, por exemplo, que pessoas negras ocupem os mesmos papéis de pessoas brancas nos anúncios. 

Além desses estereótipos, é preciso evitar também aqueles de gênero — que colocam as mulheres sempre como mães, responsáveis pela casa e pela família, sobrecarregadas em várias funções ou objetificadas. É verdade que já evoluímos bastante nesse sentido, mas ainda estamos distantes, por exemplo, de uma legislação que proíba anúncios ofensivos em relação ao gênero, como existe no Reino Unido desde 2019

Para citar outro estereótipo comum em comerciais, podemos falar ainda das pessoas com deficiência. Além de sub-representadas, quando presentes, esse grupo tem sua imagem sempre associada a estereótipos de capacitismo ou heroísmo.

Como ampliar a diversidade na publicidade e criar um marketing inclusivo? 

De acordo com o Visual GPS, estudo que citamos no início do artigo, 60% das pessoas afirmam preferir comprar de empresas que foram fundadas ou que sejam representadas em suas campanhas de marketing por pessoas como elas. Logo, além de contribuir para combater a disseminação de preconceitos, as marcas só tendem a ganhar com a ampliação da diversidade na publicidade. 

Para isso, é preciso mudar, e esse esforço deve ser feito tanto dentro das agências quanto nas organizações que as contratam para divulgar os seus produtos e serviços — e, portanto, aprovam os anúncios. 

Veja mais: Diversity Washing: o que é e como realmente valorizar a diversidade

Formar equipes de trabalho diversas nesses dois âmbitos é um primeiro passo para a construção de uma publicidade representativa e sem estereótipos. Além disso, também é muito importante desenvolver programas de inclusão mais amplos, que incluam atividades focadas, como treinamentos sobre uso de linguagem e criação de imagens para profissionais que atuam nas áreas de comunicação e marketing.  

Eliminar vieses e desconstruir estereótipos é possível e já estamos vendo bons exemplos disso. Mas todos os envolvidos precisam assumir essa responsabilidade e se comprometer a superar ideias ultrapassadas e participar da construção de um novo marketing, que tenha como pilares a representatividade, a inclusão e a promoção da diversidade na publicidade.